terça-feira, 7 de abril de 2015

Chegadas

Vou começar já por dizer que... o homem da minha vida não é o cancro. Só assim para abrir. Aliás, não tenciono largar o homem da minha vida, embora tenha medo de não o conseguir reconhecer, se ele der o ar da sua graça. Não venhas num cavalo branco, traz antes neóns a piscar! E uma tabuleta com o meu nome, vá... sempre quis ver o meu nome nas chegadas do aeroporto! E põe o nome todo, porque eu posso não acreditar... mas não digas nada, porque eu não gosto muito de cenas em público... Ok, estou a pedir muito!

Mas, apesar da violência doméstica aqui nestas paredes e da guerra que foi para me ver livre dele, tenho muito a agradecer ao cancro. Hoje sei que o cancro era só uma parte minha danada e triste e por isso não lhe fiz mais frente. Às vezes são só as nossas partes mudas a precisar de falar, porque ser mudo é só falar para dentro. Ou precisar de silêncio. E está tudo bem.

Depois do cancro se ter passeado nas minhas veias, tudo ganhou um sentido mais profundo, intenso e, ao mesmo tempo, simples. Qualquer sensação é quase uma experiência espiritual. Talvez o cancro seja só uma droga. Da boa. Agora não consigo dissociar o corpo da alma porque cada raio de sol que me aquece a pele a minha alma agradece. Agora não consigo não me entusiasmar e não me apaixonar por cada sorriso que a vida me arranca. Passei uns meses em estado de graça, apaixonada pela vida. Depois voltou tudo, a realidade, o stress, as responsabilidades e lá se foi a paixão!

Neste momento, ainda em reconstrução, estou no caminho de sentir que é compatível, que a vida não tem de pesar, que ser adulto não é na verdade uma seca, como a família, a educação, a tv e tudo o que nos rodeia às vezes nos faz querer parecer. Ser crescido e responsável é ter o privilégio de escolher e poder ter o que se escolheu.

Não há maior liberdade do que a da cabeça, como diz a música. O coração, esse, é sempre livre, com ou sem "dono". Tudo bem, só não pares de bater!

1 comentário:

INSTAGRAM