quinta-feira, 31 de dezembro de 2015



Estive aqui a pensar que resumo poderia fazer de 2015, abordando o melhor e o pior, e escolhi estas duas palavrinhas que representam as dimensões: amor versus medo, anjinho versus diabinho, bem versus mal, saúde versus doença... Amor e Dúvida. E dentro destas duas palavras cabe todo um mundo. O meu. E acredito que o de muita gente, com conteúdos diferentes. 

Amor 

Não vou falar de amor universal, por todos e nenhum, pelos gatinhos, os pobrezinhos, as plantinhas e por nós próprios, embora o amor seja só um, como diz a canção e eu seja muito defensora da universalidade do amor. 

Em 2014, voltei ao trabalho e a ter uma casinha e vida independente. Em 2015, voltei ao mercado dos afetos. Isto é tudo devagarinho. Depois de 4 anos solteirinha, com um caso patológico com o cancro, o amor lá se decidiu a querer alguma coisa comigo e eu com ele, não de forma saltitante e arrebatadora, mas lenta e indecididamente. Mercado? Mas o amor é um negócio? Se formos a ver, é, e a moeda é a troca direta. Dá-se e recebe-se e tem de se ter atenção para a transação ser justa e equilibrada, para não entrar em falência. Falência, aqui, só a respiratória e a cardíaca, se a paixão for assolapada! E isso cura-se com beijos e afins. Que me falte muitas vezes o ar, por favor! 

Pois é, namorar também é uma coisa que se esquece e se reaprende. Com que direito nos entram pela vida adentro e nos desarrumam os tarecos? O tico e o teco, esses, já não têm arrumo! Levei tão a sério esta ideia de ter nascido outra vez que, aos 35 anos, ando a repetir etapas, desta vez em versão mais crescida e com o desafio diário da aceitação e do amor que pede incondicionalidade, porque o J. é a minha noite e eu sou o dia dele. O dia abraça a noite quando o sol dá lugar à lua e é nesse abraço que nos encontramos. E é tão bom ter alguém presente, especialmente com tanta tralha do passado a atrapalhar (a visão d)o futuro. Gosto de ti.

Dúvida

Bom, eu acho que já nasci a duvidar com tanta força como aquela que me faz acreditar. A dúvida é a arma mais desempoderadora de uma alminha que existe! Tudo morre antes de nascer quando se duvida. E eu posso dizer que, do ponto de vista negativo, esta foi uma nuvem que pairou sobre 2015 e que foi chovendo de vez em quando. E as dúvidas são de chover para que se dissipem. Enquanto vão chovendo, é bom. Dúvidas em relação ao trabalho, à saúde, à família, ao amor, ao propósito, à vida. Quando duvidamos, descarrilamos e adoecemos. E é tão fácil desviar-nos do caminho. 

Duvidar é deixar de estar ligado àquilo que somos para seguir o caminho dos outros porque, à deriva e sem caminho, resta-nos o caminho que há. É nestas alturas que me sinto perdida, com medo e incerta. É nestas alturas que vem a vozinha lá de dentro dizer-me "Não tenhas medo!" "Confia!" Se calhar não estás perdida; se calhar, é só o caminho.

Há noites em que me sinto a emaluquecer, cansada de cair e me levantar. Mas depois há o dia. Mas depois há todo um novo ano pela frente.

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Grata pelo 2015 e tudo o que me trouxe de bom! E muito grata por estar aqui vivinha-da-silva, passados dois anos, cheia de maleitas qual velhinha, de tanta sabedoria! As coisas más devem ter trazido muita aprendizagem, mas não me apetece abraçá-las nestas últimas palavras do ano. Que se f****! Vou ali ser feliz e já volto! Em 2016!!!!!



Às pedrinhas e aos grandes testes no caminho! É sempre caminho.

sexta-feira, 25 de dezembro de 2015

quinta-feira, 24 de dezembro de 2015


Gosto muito do Natal. Crianças, lareira, luzinhas, embrulhos, meia-noite, gargalhadas e mesa cheia, de comida e afetos. A vida pode esconder dificuldades mas hoje é dia de dar lugar ao amor, ao imaginário, às possibilidades. É tempo de colecionar esperança que perdure o ano todo, renovar os votos e ser feliz.

Gosto de presentes, troca de afetos em matéria. Não gosto de dar porque é suposto, nem que me dêem, só por dar, a primeira coisa que aparece. Gosto de cuidar do que dou como se de laços se tratasse, porque é disso que se trata. Gosto de escolher de maneira a que a forma esconda em si o conteúdo. Gosto de fazer feliz. E é disso que gosto também quando recebo.

Gosto do ritual, gosto da re-união, gosto dos agradecimentos porque, de repente, é mesmo um privilégio termos connosco as nossas pessoas. Não tive um Natal assim durante dois anos, consegui ter a essência do Natal comigo na mesma, mas não há outro que me faça mais sentido! Grata.

sábado, 12 de dezembro de 2015



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- Olhar nos olhos é mutuamente -

- Beijo na boca é mutuamente -

- Dar a mão é mutuamente -

- Abraçar é mutuamente -

______ - 69 é mutuamente - ________

- Se é para amar, é loucamente -

- Fechar os olhos e ir -

- Sentir -

- Ir -
_

- Vir -

- Sentir -

- Fechar os olhos e ir -

- Se é para amar, é loucamente -

______ - 69 é mutuamente - ________

- Abraçar é mutuamente -

- Dar a mão é mutuamente -

- Beijo na boca é mutuamente -

- Olhar nos olhos estupidamente -
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As dores são como os amores: às vezes estão longe e às vezes estão perto. Tão perto que chegam a doer. As dores. Quiçá chegam as dores quando os amores se vão, para fazerem permanecer as marcas, os apertos, os abraços. Dor de alma não tem fim. Sempre volta. Às vezes despede-se, afasta-se, liberta. Mas é no abandono que ela mora. E, se te abandonam, regressa. 



Para as pessoas que lidam com a dor, more ela no corpo, no peito ou na alma...




Almofada na Casa dos Sonhos da "Terra dos Sonhos"

sexta-feira, 11 de dezembro de 2015


In diferenças

Apesar de sermos muito diferentes, existe união entre nós.
Amizade. Música. Alegria. Satisfação.
Há momentos em que a gente se afasta. É como se estivéssemos tristes.
Afastamento. Tristeza. Sentimento. Amor.
Rancor. Às vezes as pessoas tratam mal as outras.
No início não nos conhecemos e vamos conhecer a pessoa.
Ficamos contentes mesmo que ela seja muito diferente do que somos.
Afinal de contas, somos todos iguais.
Como é que pessoas de culturas tão diferentes se cruzam?
Amor. Abraços. Família. Irmãos. Dignidade.
Somos todos seres humanos, temos todos uma história, queremos todos uma chance.
Nós, todos unidos, só somos pessoas. Não somos mais nada. 


E foi assim que começou a peça do grupo terapêutico de dança do C.R.I.D - Centro de Reabilitação e Integração de Deficientes, na sua festa de Natal, no Teatro Mirita Casimiro, em Cascais, no passado dia 8 de Dezembro. Palavras estas, suas, que traduzem o movimento e a intenção. A diferença é inerente à vida. Por vezes a indiferença também. Só somos pessoas. Não somos mais nada.
O grupo de dança aguarda nos bastidores.

A peça "O segredo que afinal todos conheciam" pelo grupo cénico do Crid e da Apd Cascais.
Final da peça "In diferenças" pelo grupo terapêutico de dança do CRID, que eu oriento.


Os utentes do CRID ainda se apresentaram com o seu grupo musical "Os Curiosos" e com as suas peças de artesanato. Já tenho o meu Pai Natal, o árbitro deste jogo, a cuidar que dou e recebo o que mereço nestas festas! ;)


quinta-feira, 10 de dezembro de 2015


No mês passado, quando fui à consulta de rotina no IPO, a Dra. Francesca perguntou-me entusiasmada "Já passaram 3 anos, não foi?? Que nos conhecemos!" E eu respondi: "Sim, no dia 10 de Dezembro!" E voilá, é uma forma bonita de pôr as coisas. Há 3 anos que conheci a Dra. Francesca. Por acaso, para ela me dizer que eu tinha um linfoma não hodgkin - estadio IVB. Nunca ouvi da sua boca que era o fim da linha ou que a linha era fininha. Às minhas perguntas em relação ao futuro, dizia que não sabia, que os médicos também estavam sempre a aprender com os doentes. Também por coincidência, faz hoje 3 anos que fui à primeira consulta no IPO e lá fiquei, até ao ano seguinte. Faz hoje 3 anos que conheci a Dra. Francesca. Entretanto eu já estou recuperada e ela já tem uma filhota linda. Porque a vida continuou. A vida continua. 

Tenho para mim que é a Dra. Francesca que me mantém nas consultas de rotina do IPO, porque não considero nada saudável a janela dos 5 anos a prender-nos ao cancro, para além de que não são os exames que me vão dizer da minha saúde, mas a forma como me sinto. Como não faço exames - só análises de sangue - acho que, nos dias de consulta, vou lá visitá-la. São visitas de amor e não de medo. 

No primeiro ano, sentia necessidade de lhe provar que o que me tinha dito quando renunciei ao transplante e a parte dos tratamentos não era verdade, que eu ia ser capaz de recuperar e que ninguém me podia dizer que eu não tinha hipóteses de outra forma! Agora já me libertei desse vínculo, dessa necessidade, porque acredito mesmo no caminho e sei que não estou aqui para provar nada, mas para viver da forma que escolhi.

Por isso, hoje celebramos 3 anos deste namoro, mas, agora, à distância pois não faço tenções de a ver tão cedo!


Ribeira, Porto - Dezembro/2015

sexta-feira, 27 de novembro de 2015



O amor anda pela hora da morte, entregue a esta e outra sorte. Já não se acredita porque um dia tudo o vento levou. As flores perderam o encanto, a vida perdeu o espanto. Tudo está à distância de um clic, não é preciso caminhar para chegar à meta. Não é preciso correr para chegar à hora certa. Não se olha para trás para ver quem partiu. Não se pára para chorar o que se sentiu. Ainda se sente? Elas já não tremem, as pernas. Eles já não estremecem, os estômagos. Eles já não desvanecem, os corações. Mas podes chorar baixinho, em silêncio. Podes viver pianinho, com pressa. Mas sem promessa. Não é preciso conquista, nem rasto nem pista. Não é preciso sedução, nem perder a razão. Está tudo à mão. Parece tudo em vão. Já não há câmaras lentas, línguas sedentas. O imediato matou o sonho, confunde-se ação com tesão. Apaixonamo-nos pela vida para não nos apaixonarmos por alguém. E dentro da vida moram todos e já não mora ninguém. É tudo importante e nada é especial. É tudo igual. Igual. Tantos projetos, mas morreram os afetos. Tantos abraços mas fugiram os amassos. Tapa o corpo, resgata o mistério. Destapa a alma e leva-te a sério. 

Elas são independentes ou deles-dependentes, eles chamam-lhes putas entre os dentes. Eles são dependentes ou delas-independentes e elas chamam-lhes cabrões, foliões. Eles já não mandam, elas comandam. Eles são umas meninas se se mostram carentes e elas fraquinhas se não lhes fazem frente. Gajos e gajas, porque homens e mulheres já não são gente.

Não sei se dar a mão é segurar o caminho. Tragam de volta o carinho. 




sexta-feira, 20 de novembro de 2015



É muito mais simples explicar aos mais pequenos que o mundo está dividido em bons e maus. Para o seu cérebro é uma informação fácil de arrumar e o mais importante é que as figuras parentais estejam do lado dos bons e que lhes garantam proteção contra os maus. E é isso que são os pais, heróis de trazer por casa. Crescemos e vamos percebendo que as coisas são bastante mais complexas, as pessoas boas também fazem coisas más e as pessoas más - ou que fizeram coisas feias - podem ter sido as pessoas mais simpáticas para o vizinho do lado. No mundo dos adultos, portanto, o mundo já não se divide em bons e maus ou já não era esperado que assim fosse. É aqui que os heróis de trazer por casa às vezes se transformam nos maus da fita, ou, tão simplesmente, humanos, dependendo do nível de pensamento de que estamos a falar, mais infantil ou mais diferenciado.

Preocupa-me que o mundo fique cada vez mais dividido entre bons e maus, porque, ao categorizar desta forma, inevitavelmente, vamos cair num lado ou no outro, vamos posicionar-nos dentro de uma equipa ou outra, contra o adversário a agredir ou a combater. Os maus querem destruir os bons e os bons querem destruir os maus.

E estar de um lado ou do outro tem as suas consequências. Uma pessoa que se percepciona a ela própria como má, seja pelas suas ações, pelas suas características ou pela forma como os outros a tratam, fica privada de conhecer e contactar com as suas coisas boas, o que a pode deixar num caminho cuja saída é destrutiva, para si própria ou para o outro. Uma pessoa que se assume só como boa corre o risco de pôr tudo o que é mau no exterior, nos outros, e não assumir as suas coisas que por vezes também têm consequências negativas, para si e para os outros.

As crianças aprendem a chamar maus aos que fazem coisas más e bons aos que fazem coisas boas, mas, na verdade, parece-me bem ajudá-las a perceberem em si as suas coisas boas, para além de ações que tenham tido e que tenham tido consequências negativas, bem como ajudá-las a tomarem consciência das consequências negativas de algumas ações, porque lhes ensina que o que são e o que fazem tem impacto no mundo que as rodeia. Quem aprende isto, aprende na sua relação consigo mesmo, com o outro e com o ambiente. Quanto mais polarizada for a nossa ideia das pessoas e do mundo, maior a probabilidade de o mundo se dividir em partes e, no futuro, em pedacinhos difíceis de reconstituir. Para algumas pessoas, o mundo já está tão dividido dentro de si que já não há retorno.

Prefiro pôr as coisas aqui em bem e mal, não no sentido da moral mas no sentido, não só da intenção, como de uma ação que comporta uma contribuição. De que forma queremos contribuir? Para o nosso bem-estar, para a saúde do nosso relacionamento, para a felicidade dos nossos, para a paz no mundo? De que forma conciliamos a pegada positiva que queremos deixar - caso queiramos - com as necessidades primárias do nosso ego, de poder, controlo e competição pela sobrevivência, esteja esta traduzida em dinheiro, comida, recursos, terra, beleza, mulheres, homens, força ou razão?

Na altura em que os concursos de beleza estavam na moda, no formato Miss Universo, Mundo ou de cada país, as meninas bonitas foram desvalorizadas na sua vontade de acabar com a fome no mundo, as guerras e as desigualdades. Na verdade, o bem tem um lado estético que faz a diferença no mundo. Os monstros são feios, o medo, se tivesse cara, seria horrenda - ou talvez se risse macabramente disto tudo - e a destruição fere os olhos. Elas, as misses, com a sua beleza, contribuíam para um mundo mais bonito e queriam contribuir com uma coisa tão fútil como a paz, numa época em que ser bonito não era compatível com inteligência. Se és burra, pelo menos, diz que vais acabar com a fome no mundo! E eis que o mundo se encontra na unidade de cuidados intensivos, a precisar de resgatar e juntar uma brigada de misses de todos os países! Eu própria me sinto um bocadinho Miss em campanha pela paz no mundo!

O ser humano é capaz de matar, odiar, agredir, destruir e morrer. É verdade. Temos um lado sarcástico, invejoso, mordaz e macabro. No dia em que acabar a guerra no mundo, teremos conquistado a imortalidade. Enquanto formos capazes de morrer, seremos capazes de matar. Mas, enquanto formos capazes de viver, seremos capazes de amar.

As crianças contactam com todos estes lados do ser humano nas histórias de super-heróis e vilões, partes de si próprias e dos seus, personificadas e investidas de efeitos especiais e peripécias. É assumindo todos estes lados que vamos estar mais protegidos de deixar que o mal domine sobre o bem. Enquanto o mal for partir um brinquedo do amiguinho, estamos nós bem - e o amiguinho mal. Enquanto o mal for falado, representado, discutido e brincado, em jogos e contextos seguros, estamos nós bem. Enquanto o mal for ignorado e posto fora de nós, vamos continuar a combater e numa guerra sem fim. 

Uma guerra é sempre mundial. Dêem armas de brincar aos mais pequenos, deixem-nos brincar às lutas, ensinem-lhes as guerras de "faz-de-conta" para que continuem a matar de forma simbólica/metafórica quando crescerem e não precisarem de armas verdadeiras para matar os seus fantasmas em forma de pessoas.

Perante uma pessoa má, uma pessoa que tenha perdido qualquer capacidade empática e apetência para o amor ou cuja forma de estar não seja compatível com a existência de seres e de formas de pensamento diferentes no mundo, não tenho a ilusão de que não lhe devesse dar um tiro nos cornos para garantir a minha sobrevivência e a dos meus. Se me pisarem os calos, emerge a cabra que mora dentro de mim. Se me magoarem, rogo pragas e manifesta-se a minha bruxinha má. Se me derem um estalo, levam outro. No meu mundinho. Em pequenino. No imediato.

Acontece que, cada vez mais, penso em grande e tenho uma visão mais ampla. Estamos todos no mesmo barco. E, se afundar, não vem o Noé salvar as crianças - as que não dêem pontapés nos amiguinhos e não se portem mal nas aulas, os pequenos "terroristas"(!) - e os animais, os domésticos, porque os selvagens matam pessoas! Ou talvez seja disso que o mundo está a precisar... De uma arca que salve os bons. Não sei é onde é que vão viver...




Lutei sete meses contra um cancro. Desisti da guerra porque percebi que estava a utilizar armas de destruição massiva dentro de mim e, na medida em que o inimigo estaria dentro do meu corpo, se o continuasse a atacar, eu poderia não sobreviver. Atacar o mal era também atacar-me a mim. É o problema das guerras: é preciso sobreviver a elas. No limite, voltaria a fazê-lo, se o medo tomasse conta de mim, mas não numa primeira instância. Sei que há coisas más em mim, toxinas, mágoas, medos e afins, mas as coisas boas são maiores. E rezo para que, no mundo, as coisas boas sejam sempre maiores.

Olho para Paris e tenho orgulho nos parisienses que me fazem acreditar nos seus valores porque se juntam em nome dos mesmos. A França inspirou "A Portuguesa" e eu rezo para que, contra os canhões, marchemos todos pela liberdade, a igualdade e a fraternidade. Não me orgulho do massacre na Síria que nada tem de fraterno, mas espero que o mundo se encaminhe no sentido da criatividade e da racionalidade, juntas, na solução de conflitos. E que as flores, as velas, os abraços, a solidariedade, o sentir conjunto sejam mais massivos do que as armas. É a realidade. Dualidade. Emergências. Esperança.



Há coisas que não se contam a ninguém. Ninguém. Vai daí ficam cá dentro. 

Há coisas que circulam nas nossas veias e palpitam. Vergonha. 

Há coisas que não queremos partilhar para não ouvir. 

Como se mais ninguém andasse escondido. 

Há coisas que todos são e todos criticam. 

Das coisas que sofrem, as que morrem jazem em mim, porque o tempo não apaga o que o tempo um dia trouxe e, se assim fosse, já não havia tempo. 

É justo falar e deixar rebentar porque, do outro lado da rua, existe a alma que um dia foi tua e que deixaste vaguear. 

Re-volta-me, dia, que a noite é para sonhar!




sábado, 14 de novembro de 2015



No Dia Mundial da Bondade, mais um ataque terrorista, mais medo espalhado pelo mundo. Diz o autor Gregg Braden que vivemos numa era de extremos e é exactamente o que sinto quando, com gratidão, assisto a movimentos de amor e solidariedade pelo mundo fora e, com perplexidade, me deparo com os cenários de horror como o de hoje, que nos chegam através dos media. Parecem dois mundos paralelos, um que semeia a esperança e o outro que desacredita a humanidade. Curioso é que não são paralelos, porque as ondas de amor e solidariedade multiplicam-se quando somos tocados pelas grandes catástrofes. E o mundo é só um. Parece então que o medo e o amor têm de andar de mãos dadas para o medo não engolir o que fica dos grandes abalos. Acontece comigo. Assim sendo, o meu apelo para o amor, a criatividade e a superação constitui uma necessidade que surge para me capacitar para os grandes desafios. Não falo de bondade por ser boazinha, mas para fazer frente às ameaças. Não falo de amor por filantropia, mas para fazer frente ao medo. É porque acredito que é na força criativa e criadora que está a resposta para as grandes tragédias que nos assaltam e pedem trancas à porta. É mesmo o maior dos desafios voltar a abrir a porta. É mesmo o maior dos desafios voltar a abrir as fronteiras. É mesmo o maior dos desafios confiar, continuar a acreditar. Hoje o mundo dói. Mas todos os dias o mundo dói. Que todos os dias o mundo seja capaz de amar.




(Foto: Instant Bulb. Espetáculo Arte Move "Não me Calo... Danço")



segunda-feira, 9 de novembro de 2015


Às vezes estamos tão focados no que temos de fazer que nos esquecemos de que, para valer a pena, basta um momento. Um momento e tudo faz sentido. E hoje foi um dia de momentos que individualmente ou juntos ultrapassaram o que queríamos cumprir, espalhar a importância da Generosidade nas pessoas e entre as pessoas. Pausa para falar nisto da Generosidade/Kindness.

Quantas vezes somos tão exigentes que nos esquecemos de exigir o mais importante? Reconhecermos as nossas coisas boas. Porque isto da Generosidade começa dentro. Só depois pode ser honesta para os outros. Deixemos que os três planos caminhem em simultâneo, o que nos damos a nós mesmos, o que damos aos outros e o que damos ao mundo em que vivemos. E que saibamos que recebemos sempre que o coração se insufla. De alegria. De amor. De gratidão.

A Life Vest Inside é uma organização americana que tem como missão empoderar e unir as pessoas de todo mundo através da Generosidade, capacitando e dando ferramentas para que cada pessoa possa reconhecer o seu potencial e que, através do mesmo, possa ser um catalizador de mudança positiva no mundo. Todos os anos leva a cabo o Flash Mob mundial "Dance For Kindness" em que participam dezenas de países do mundo inteiro.

Este ano, em Portugal, participou um grupo de Lisboa e outro de Cascais. Participei com o CurAção e a Arte Move, no âmbito do nosso projeto de intervenção social "We Move", no Largo da Estação de Cascais. Distribuimos cartões com ações que celebram a nossa capacidade inata para o amor, com o compromisso de nós próprios as realizarmos. Erguemos a nossa bandeira, as nossas bandeiras: a da generosidade e a de Portugal.




sexta-feira, 30 de outubro de 2015



Eu já fui 3x ao lançamento do livro da Sandra "O meu cancro morreu e eu renasci." E 2x ao da Flávia "Quimioterapia e Beleza". Faço questão do reencontro, faço questão de reabsorver a partilha porque nunca é igual. Um ano tira e acrescenta muita coisa, leva e traz pessoas novas e renovadas, amadurece os discursos e fortalece os laços. Do mundo dos projetos sobre cancro, em Portugal, tenho um carinho especial pela Sandra (Partilhas), pela Marine (Cancro com Humor) e pela Vera (Cancro é Vida), pessoas que passaram a fazer parte do meu mundo, mesmo quando falamos com menor frequência.

Cada projeto que nasce do cancro é antes de mais nada um projeto de pessoa em crescimento e reconstrução, é antes de mais a pessoa e só depois a missão. Mas os melhores são os que permitem que a missão ultrapasse a pessoa e fale por si. E aí a pessoa não desaparece; apenas se torna melhor e mais forte. Quando são os egos que nos movem, diminuimos os outros e perdemos força. Queira eu ter sempre esta lucidez no caminho.


quinta-feira, 29 de outubro de 2015


De todas as doenças que me podiam calhar, calhou-me uma que me atingiu o corpo todo: sistema linfático, sistema nervoso central... Não foi simpático calhar-me na rifa um linfoma em último grau, mas, por outro lado, tenho a dizer que fico contente com um diagnóstico que atestava que o meu corpo estava todo doente e não só uma das suas partes. E eu vou mais longe: o meu corpo físico, o meu corpo mental, o meu corpo emocional e o meu corpo espíritual, que também se manifestam através das minhas células, estariam também doentes. Estando eu toda doente, não tinha indicação para radioterapia ou cirurgia, que exercem uma ação localizada, que é uma coisa que a mim me faz um bocado de comichão. Uma doença não pertence a um corpo que constitui um sistema que está todo interligado? Para terem uma ideia de tão longe que vai a minha comichão, eu nem aceitei (ainda) que a dentista me arrancasse um dente por vias de uma cárie que se alojou num dos sisos! Faz-me comichão esta coisa de curar o corpo arrancando partes.

Entender o corpo como um todo. Entender uma pessoa como um todo. Entender o planeta como um todo. Entender o Universo como um Todo. Entender um sistema, uma empresa ou uma família como um todo. O todo nunca é de tirar a individualidade, a identidade e a importância de cada parte, seja essa parte um país, um cônjuge, um filho, um rim, uma árvore, o vizinho, um corpo, uma alma, um projeto.

Falemos de partes, sim, mas não isoladas do todo. A ciência ensinou-nos a controlar variáveis mas não pode controlar a realidade, na medida em que a realidade é mais do que a soma de variáveis, que numa dança interagem e nos trocam com voltas e baldrocas. E seria roubar a magia da vida conseguir controlar não só as variáveis de uma forma isolada, mas também a forma como as mesmas se relacionam e as ínfimas possibilidades de combinações entre elas.

Claro que conseguimos resolver um problema eliminando uma das partes da equação, um útero, um criminoso, uma comunidade, uma erva daninha, um marido, um delinquente, os tumores, as partes doentes da sociedade. Elimina-se e resolve-se. Mas o que é que se resolve? A chatice. Será que se resolve o problema de fundo?

As pessoas continuam a olhar para si aos bocados, corpos disformes e imperfeitos, objetos de desejo, controláveis para não se tornarem controladores. Enquanto controlarmos as partes não deixamos que as partes nos controlem. As mulheres querem-se inteiras, os homens querem-se inteiros, as pessoas querem-se de verdade, com sangue quente nas veias e o coração a palpitar. Não quero entrar num consultório médico para me mandarem tirar a roupa ou olharem para os meus neutrófilos sem saberem como me sinto quando abro as pernas a um desconhecido numa marquesa. Não quero um mundo de pessoas que sintam que não têm nada a ver com as guerras que se passam fora das suas fronteiras. Não quero um mundo de pessoas que achem que poluir o chão que não seja o da sua casa é normal. Não quero ver mulheres a quererem igualar os homens e a boicotarem as partes que as diferenciam e tornam especiais, como se isso não tivesse consequências a um nível muito mais alargado. Não quero ouvir pessoas a dizerem que não mudam porque a sua mudança não fará diferença se os outros também não mudarem. Onde está o poder de cada um? 

A minha cura passa por atingir esta sintonia, de várias partes em mim, de várias partes em consonância com o todo, o todo que eu sou, o todo que é o relacionamento em que me encontro, o todo que é a minha família, o todo que é o meu país, o todo que é o mundo em que vivo, o todo que é o universo que me trouxe a oportunidade de nascer e renascer. É para esta consciência global que quero contribuir, sendo eu própria cada vez mais inteira. O todo nunca poderá diluir o poder que reside em cada um porque é do poder de cada um que se alimenta o poder do todo. 





E para mim o maior problema do mundo em que nos encontramos - falemos de economia, política, educação, saúde, família, amor e por aí fora - é de visão, uma visão muito curta

quarta-feira, 21 de outubro de 2015


Corpo. Mente. Espírito. Indonésia. Cabo Verde. Batuque. Dança contemporânea. Pessoas empreendedoras e não apenas "empreendedores". Música. Metáforas. Abraços. Criatividade. Entrega. Amor. Sinais. Encontros. Reencontros. Medos. Gargalhadas. Lágrimas. O entusiasmo da Sandra na primeira fila a dançar ao som da Viviane e da Dilana. A Catarina e as batucadeiras. A Sónia que interpelou o Sr. Presidente. A sua Soraia. A Raquel de Trás-os-Montes que trouxe o tornado e a tempestade porque só ela leva tudo pela frente! (E faz massagens maravilhosas!) A Andreia em erupção. Transformação. As 20 horas que o Hugo trabalha por dia - depois daquela dose de fruta, trazemos todos poderes especiais! Vitaminados, Inês e Pedro! Bebo mais da vossa alegria do que qualquer outra vitamina! Comer sem culpa. Viver sem culpa! A Ollie que me desconcerta com um "You're so sweet. Why are you so sweet?!" Crer para Ver. Crer para Ver. Crer para Ver. A fé da Eduarda. O coração da Marta. Das Martas! Eu sou... meiga! Sorrisos. Círculos. Superstars. Powermind. Quatro Cantos. Jogos. Dinâmica. Eu, tu, nós, eles. Uno. O mundo. O amor universal. O universo amoroso. Gratidão. O que é que tu fazes? ... Silêncios. Reflexão. Perguntas. O bacalhau com crumble de amêndoas! O arroz de polvo na Floresta. Os pães e os queijos a mais! Love your curves and all your edges, all your perfect imperfections. A Lisa que nos pôs a mexer. A Orlanda que não queria cá um gajo com armas na nossa comunidade! Passa aí o prato da minha filha que ela deixou metade do peixe no prato! Filhas, mães, mulheres. Amizade. Partilhas. Cuidados. A banquinha amorosa da Sandra M. A magia do Fábio. O Lucas. A Susana. O Mário. O Gonçalo que esperava que fosse tudo mais formal. Eu que tinha medo do networking. Qual networking? Só vou lá ser eu! Os biocos maravilhosos e o senta-e-levanta da Lurdes. Self-confidence. A embaixatriz. Intuição. Arco-Íris. Cores. Emoções. Conexão. Individual. Colectivo. Colaboração. Clai. Clai. Claiii. Pode ser Cláudia, é mais fácil! De onde é que nos conhecemos, Judite?? A mãe do Benvindo que acha que não sabe dançar. As muletas da João a sustentarem a nossa vulnerabilidade. A força da vontade. A vontade de dançar. A vontade de cantar. A vontade de viver. A Paula no ecrã. A cura. A mudança. Um brinde aos novos começos. Beginners. Conquistas. Acreditar. A cortiça. Sonhos. Portugal. Afetos. A magia dos afectos. 


Fotografia: Manuela Sabino

sábado, 17 de outubro de 2015


Não pretendo com este post ser muito rigorosa em termos científicos mas hoje ouvi, no programa "Faz Sentido" da Ana Rita Clara (Sic Mulher), falarem nesta condição de Crescimento Pós-Traumático (CPT) relativa às mulheres que tiveram cancro da mama.

O CPT diz respeito a mudanças positivas decorrentes de uma experiência traumática, como se, de alguma forma, esta experiência induzisse um salto de crescimento que não aconteceria de forma tão marcada sem o trauma. No caso do cancro, depois da experiência, a vida seria posta em perspetiva, seriam reavaliadas as prioridades e teriam lugar mudanças de acordo com o novo olhar sobre si próprio, o mundo e a vida.

A PSPT (Perturbação de Stress Pós-Traumático) é um distúrbio de ansiedade que pode surgir depois da experiência traumática e que dá lugar a diversos sintomas ou manifestações que perduram no tempo.

Reconheço as duas condições em mim, dois anos depois. O CPT é logo o primeiro a manifestar-se. Toda eu era borboleta quando me livrei do internamento e este blog resulta deste crescimento. Da PSPT, reconheço em mim, sobretudo, a hiperativação/hiperatividade fisiológica: sobressaltos, insónias, estar sempre em modo de alerta como se estivesse em perigo, déficit de atenção... mas a PSPT veio com o tempo, com o resgate da vida "ativa". É como se o corpo tivesse sido reprogramado para se defender e proteger por tempo indeterminado, o que resulta num gasto de energia que me deixa sempre no limbo.

Se ganha o CPT ou o PSPT, creio que vão a par e passo, nuns momentos ganha um, noutros ganha outro. Os desafios da vida não vão parar, mas as coisas boas também não que eu sou teimosa! A vida não volta atrás e muda para sempre porque sempre muda. A resposta eu sei que é AMOR e sei que é confiar, mas às vezes não enxergo nada.

Eu sou aquela que nunca sabe como se ligam os faróis de nevoeiro. E ainda hoje vi o nevoeiro sobre a serra que, visto de fora, é muito bonito, mas, quando se está lá no meio, nunca se sabe o caminho. E às vezes o meu problema é mesmo não saber onde páram as luzes!

Quanto ao CPT, vai sempre levar a melhor, mas seria bom não esperarmos pelo trauma/sofrimento para fazermos determinadas aprendizagens e levarmos a cabo as mudanças de que precisamos para sermos felizes, só porque sim!

sexta-feira, 9 de outubro de 2015



Uma das várias dimensões que devo recuperar depois de ter sido trucidada pelo comboio-quimioterapia é a da mulher, a par de todas as outras. O corpo fica feito num 8, a menstruação desaparece, as hormonas alteram-se, as emoções embrulham-se num novelo gigante. Já passaram dois anos e ainda estou a falar nisto.

Ter ficado sem as formas do meu corpo como eu as conhecia devido à perda de peso, ter perdido o cabelo e as pestanas que para mim eram parte da minha beleza, ter ficado sem menstruação, não ter tido qualquer relação afectiva e/ou sexual durante muito tempo e ter visto o futuro da minha condição de mulher como eu o esperava hipotecado sem garantias de o recuperar, tudo me fez valorizar isto de ser MULHER. Tudo isto me fez acordar para o adormecimento que existe neste mundo quanto à beleza e magia inerentes a esta condição: a feminina. Neste mundo, leia-se: em muitas mulheres.

Às mulheres é ensinado que a menstruação é uma coisa feia, que com a menstruação vem uma carga de trabalhos, como a dor de cabeça que é ter homens à perna que só nos querem para "uma coisa", uma coisa que também não fica muito bem às mulheres decentes dizer em voz alta: sexo. O ciclo menstrual traz também as variações hormonais e, portanto, a TPM, responsável pela infelicidade que é para mulheres e homens terem de levar com as nossas neuras, como se naquele período fôssemos dominadas por um qualquer espírito mau que não nos pertence. Mas pertence.

Depois da quimioterapia e também depois de ter retomado a minha vida afectiva/sexual - toda uma reiniciação e uma descoberta - já tive 3 infecções urinárias, que me têm feito confrontar com algumas crenças que estão incutidas em nós, mulheres, e que acredito que ainda nos condicionam numa vivência plena e livre. Sim, porque não é só na política, no mundo empresarial ou na família que temos muitas conquistas em curso e por fazer.

A primeira enfermeira que encontro na triagem reage assim à infecção urinária: "ah, é o problema de ser mulher!" Uma amiga diz-me, em tom de brincadeira (mas nas brincadeiras ficam implícitos os preconceitos e as crenças): "Sua maluca!" A minha vizinha: "Ah pois, agora tens um namoradito, isso já se sabe! Nós as mulheres, é assim... por isso é que eu não quero nenhum homem!" E podia continuar por aí fora... De repente, apercebo-me de que não interessa se têm 30 anos ou 60, para as mulheres, sexo e infeções andam de mãos dadas. E os homens fazem-nos mal. É uma pescadinha de rabo na boca. Já não basta eles só nos quererem para essa coisa, essa coisa ainda nos põe doentes.

Claro que eu acho que as mulheres já fizeram um longo caminho em relação à liberdade sexual e ao direito ao prazer sem culpa, mas, minhas amigas - e este é mesmo um post de amiga -, ainda há muito a fazer! E não passa por nos despirmos publicamente ou termos os parceiros que quisermos para provar seja o que for, muito embora sejamos livres de fazer essa escolha. A verdade é que eu acredito que o nosso corpo espelha tudo isto que ainda está no inconsciente coletivo e de cada uma e um.

Depois de ter perdido a lubrificação durante os tratamentos, senti saudades de sentir o sangue descer e percebi, quando a menstruação voltou, 4 meses depois de terminar a quimio, que a sensação é semelhante à da lubrificação decorrente da excitação sexual. É literalmente um terreno fértil que representa a nossa capacidade para criar, parir e celebrar a vida. Sangue é vida.

Não tomo a pílula porque quero estar em contacto com todas as fases do ciclo, com a riqueza de emoções que está em mim e com as mudanças que ainda se verificam no meu corpo que ainda não estabilizou. Quero conectar-me com os ciclos da natureza e com o meu potencial criativo e criador, que, numa mulher, não passa só por ter filhos. Quero usufruir desta fase o tempo que ainda me estiver destinado a vivê-la antes de chegar a menopausa, outra fase igualmente rica mas que não estava pronta para acolher aos 30.

Às vezes gostava de poder ter uma filha só para lhe poder ensinar coisas como estas:

- os homens não são bichos maus que nos querem comer e que ainda por cima nos causam infecções, se nós soubermos respeitar-nos e mostrar-lhes como somos por inteiro; eles estão muitas vezes perdidos na tarefa de nos conhecer, porque muitas vezes também queremos esconder a nossa vulnerabilidade e necessidades - está muito mais valorizado socialmente ser forte e impermeável do que ser assumir fragilidades e sensibilidade; muitas vezes só vêm partes nossas porque também não assumimos as outras.

- mostrar-nos por inteiro implica reconhecer as nossas emoções como parte da nossa verdade e a TPM só mostra muitas vezes aquilo que tentamos esconder o resto do mês;

- ser mulher não é um problema, em contexto nenhum, nem no meio laboral, nem na vida pessoal; ser mulher enriquece qualquer meio onde nos integremos, se assumirmos o que nos diferencia em vez de nos tentarmos equiparar aos homens, se deixarmos de competir com os homens e umas com as outras;

- homens e mulheres têm muito mais a ganhar se se aproximarem em vez de andarem sempre em guerras de poder; é da sua união que nasce a vida, que se dá à luz, que se dá a evolução da espécie;

- as mulheres são muito mais fortes unidas, não contra alguma coisa ou alguém, mas juntas nas coisas que muitas vezes guardam para si próprias, medos, inseguranças, dúvidas e dores. Vão descobrir que não estão sozinhas e libertar-se da necessidade de perfeição;

- a menstruação e o ciclo menstrual são a prova de que o corpo é mágico, a vida é cíclica e as oportunidades de nascer/morrer/renascer simbolicamente numa mesma vida são múltiplas. Durante a menstruação o corpo renova-se e tudo recomeça. Tudo se transforma.

- o sexo é uma coisa boa, permitida e é suposto ser prazer para todas as partes intervenientes, com liberdade consciente e informada; com a liberdade sexual, o amor talvez tenha vindo a perder terreno, porque podemos decidir pelo sexo sem alma e separar em gavetas os tipos de relacionamento que escolhemos ter com determinadas pessoas, mas sexo com encontro de corpos e almas, sem separação entre corpo, emoções e espírito, constitui a materialização do poder que duas pessoas têm quando literalmente se juntam, se fundem e se perdem/encontram uma na outra: o poder do amor, o do amor que cura. E acredito que o mundo de hoje precisa muito mais disto, de que se faça amor, de todas as formas, orientações, convicções, fetiches e feitios; 

- se não houver respeito, não é amor;

- ser mulher é poder gerar vida, dar colo, ser frágil, ser forte, ser cheia, ser histérica, ser lunática, ser bipolar, ser infantil, ser maternal, ser sensual, ser amiga, ser fodida, ser bruxa, ser especial. é embarcar num desafio e ser superação.

Se um dia tiver um filho, também lhe vou ensinar tudo isto e ainda que o seu papel é muito importante neste mundo e no mundo de uma mulher que o escolha como parceiro de jornada, seja por um dia, um ano ou uma vida.



quinta-feira, 1 de outubro de 2015



Cada um de nós é protagonista do seu próprio filme de vida. Mas cada um de nós é também ator secundário dos filmes das pessoas que são importantes para nós. E calha que ainda figuramos na vida de todas as pessoas que se cruzam connosco e que reside aí uma quota residual de responsabilidade - ainda hoje dei um encontrão a uma rapariga cega e cedi o lugar no comboio a uma mãe com uma criança de colo. A diferença em relação ao cinema é que, no cinema, o guião é imposto, ainda que aceite a priori; na vida real, acreditamos - eu acredito - que somos nós que o escrevemos, à medida que fazemos escolhas. Será mesmo assim? Seja como for, é da responsabilidade do ator no cinema ou da pessoa na vida real interpretar ou desempenhar, de forma fiel e honesta, o seu papel. E assumimos vários ao longo da vida.

Na vida real, também há cenas que nos parecem escritas por "alguém", um qualquer destino que nos calhou na rifa, um fado incontornável que simplesmente se dá. Por um lado, acredito que a tomada de consciência relativamente aos nossos comportamentos, pensamentos e emoções, mas principalmente do impacto que estes têm nos outros e nas situações a cada momento, diminuirá a sensação de vítima de um "destino fatal" (uma redundância). Por outro lado, há mesmo merdas que nos acontecem que parecem obra do Destino, aquele gajo que só não ganhou ainda o nobel da Literatura porque os tipos que atribuem os prémios têm medo de fantasmas.


O Destino é lixado porque é um gajo dúbio: tem pacto com o Diabo e tem pacto com Deus. Interessa-lhe uma boa história, tenha ela "uma casa na pradaria", "música no coração" e um "barco do amor" ou uma "lista de schindler", "pesadelos em elm street" e um transatlântico de nome "titanic". É por isso que a mesma pessoa pode ter momentos de terror na sua vida que aparecem sob a forma de catástrofe ou de mansinho sem a pessoa se dar conta, a par de momentos mágicos em que tudo se encaixa na perfeição sem o mínimo esforço, de preferência em slow motion.

Imaginando que eu já fui anjinho e que, antes de encarnar, escolhi o guião e aceitei protagonizar o filme da minha vida atual (como algumas teorias defendem), a psicose agrava-se. E às vezes pergunto-me se a diferença entre saúde e doença mental, para além de ser quantitativa, como costumo dizer, não está não na adaptação à realidade, mas na adaptação à sociedade e aos códigos sociais.

Cada um de nós é ator principal, ator secundário e figurante. Não estamos sozinhos no filme. É difícil dosear responsabilidade e liberdade, saber onde terminam as nossas e começam as dos outros. Mas, se cada um se sentir responsável e livre (quase uma redundância também!), cada um vai reconhecer essa responsabilidade e essa liberdade no outro.

Quanto ao Destino, dêem-lhe de uma vez o Nobel para ele ir para uma ilha, ter uma vida louca só para ele e deixar de se entreter com as dos outros! E não falei aqui nos espectadores, mas o público fica para outra oportunidade, porque eu também tenho medo de fantasmas...

terça-feira, 29 de setembro de 2015



Que bom que haja cada vez mais pessoas alinhadas com o propósito de tornar o mundo melhor, com pessoas mais criativas/felizes, co-criando, co-pensando e coexistindo! Hoje, por ter dado aula com bossa nova de fundo, o meu aluno/cliente de pilates fez uma "viagem" gigante até aos seus tempos de faculdade e ao tempo em q viveu no Brasil. E é nisto que acredito, na experiência criativa-expressiva como passaporte para o contacto com a experiência pessoal, como potenciador de auto-conhecimento e como motor de interação entre culturas e coexistência de diversidade e unicidade na aldeia global. Todos conhecem a linguagem das emoções. Todos conhecem a linguagem não verbal. Nas coisas mais simples moram os segredos mais preciosos. Cada vez acho mais que a complexidade é uma manobra de diversão e abstração. Importa estar, ser e descobrir. O resto é ir.



Sei que coexistimos com pessoas que não são nada disto ou que não estão nesta frequência, mas a minha estratégia de eleição - não quer dizer que não seja opção - não é combativa: não quero combater inimigos, doenças, resistências, medos e contrariedades. O meu lema é aumentar o que quero em mim, para a minha vida e para o mundo: amigos, saúde, confiança, amor e oportunidades.


Se aumentarmos o coeficiente de coisas boas, as difíceis tornam-se menores; ou continuam grandes, mas não definem a vida; nem a vida, nem uma pessoa, um país, uma família, um relacionamento ou um sonho. O problema é quando não há espaço para coisas boas. O problema é quando não há espaço para sonhar.                                                       

quarta-feira, 23 de setembro de 2015


Já devem ter ouvido esta canção. É do Agir. Não confundir com o movimento da Joana Amaral Dias, que leva mais a sério do que eu esta coisa da Ação. Aliás, eu acho que o bebé da J.A.D. vai nascer com a língua de fora e com uma tattoo a dizer "amor de mãe, mulher e cidadã livre e responsável". Com iniciais, que um recém-nascido não tem pele para isto tudo... Mas é assim mesmo, os nossos genes trazem inscrições pré-históricas e depois levamos uma vida a descobrir o que é nosso, dos nossos pais, do ambiente, dos astros ou do destino.

Hoje acordei com um torcicolo. Alguém me "partiu o pescoço". Os torcicolos, para mim, estão relacionados com a resistência a olhar para o lado e ver outras perspetivas ou mudanças de direção. Hoje eu acho que este meu torcicolo me pede para olhar em frente, como um burro, para me focar numa direção e manter-me nela. Às vezes também é bom não olhar para o lado, não nos distrairmos com interferências que podem ser desde pessoas a acontecimentos, emoções e pensamentos que nos vêm desviar do caminho.

"Ela parte-me o pescoço. É impossível não olhar para trás." Hoje é-me impossível não olhar para a frente. Ainda bem que, segundo o povo, é para aí o caminho.




P.S. Quando este bloqueio passar, provavelmente, vou voltar a olhar para o lado e perceber que posso mudar de direção sem culpa, sem medo e sem me chatear com as interferências que me vêm mostrar novas possibilidades. Novos caminhos nos esperam quando nos abrimos a eles. Agora ainda não consigo saber quais são, mas venham eles!

segunda-feira, 21 de setembro de 2015



A mesquinhice é a arte de dar importância a coisas relativamente relevantes, que naquele momento escolhemos ver como apocalípticas porque temos a visão limitada. 

Ser mesquinho é ter medo de perder: o dinheiro, o amor dos outros, o tempo, o autocarro, a razão, a vida, o sentido, o controlo, o poder, a cabeça; é não saber esperar para ver mais além; é estar muito triste; é invejar o mundo dos outros que não está a acabar (será que não está?); é ser pequeno e querer que o mundo caiba na palma da sua minúscula mão; é ser esquecido porque não importa lembrar o que se tem ou o que já se é (é ser-se ingrato, portanto). 

Ser mesquinho é querer ser perfeito e não perdoar um cêntimo no troco; é sentir-se imperfeito e chorar a imperfeição dos outros; reclamar da justiça divina e do árbitro do jogo, que é o mesmo.  




Quando estava internada, na fase mais complicada, recebi a visita de uma amiga que me disse: 

"Rita, olha para isto tudo como se fosse um filme!"

Não é uma competência fácil, a de nos distanciarmos de nós mesmos e do que estamos a viver. Também não é fácil ter uma visão abrangente quando estamos no aqui e agora. Se calhar nem é suposto. Acho mesmo que não é suposto. Mas a tendência para a mesquinhice advém do apego ao que sentimos que temos, porque o que temos nos dá uma segurança sem a qual não podemos viver. E é tudo ilusão. Conseguimos sobreviver à diferença, às mudanças e ao caos. Há vida depois da "morte". Se pode ser o inferno, também pode ser o paraíso! 

Para contrariar a mesquinhice, só a fé: acreditar sem garantias, confiar sem saber. Não nos queixemos de barriga cheia. 

Não discutas trocos, não compares a tua dor à dos outros, não te queixes da falta de tempo, não sejas impaciente, não julgues cada comportamento, não negligencies cada passo que dás, não subestimes a inteligência terrena, divina ou qualquer uma que esteja subjacente à vida. Não te esqueças. Sobretudo não tenhas a memória curta.

De repente, senti-me a Alexandra Solnado, a canalizar a mensagem de Jesus. Não, não baixou em mim nenhuma entidade superior (ou se calhar, estou mesmo possuída e não sei porque isto são tudo vozes que habitam a minha cabeça! Não se manifestem mais do que isto, seres do além-Terra, que eu não tenho saúde para essas aventuras...). 

É exactamente quando reconheço a mesquinhice, para comigo, para com os meus ou em mim que digo para mim mesma: "Não te esqueças!" E esqueço-me todos os dias de muita coisa, mas não do mais importante: está tudo certo!

Não há coisas urgentes a não ser mesmo viver, dizer a alguém que é importante para nós ou socorrer outro alguém de um enfarte (e mesmo assim, deixem lá o senhor que se calhar está só enfartado disto tudo!). Tudo se resolve. Tudo vai para onde tem de ir. Anda tudo com pressa não sei do quê. Eu às vezes também penso nos meus 35 anos e questiono o que ainda não vivi ou conquistei, mas depois pergunto-me "para quê? estou com pressa mesmo do quê?".

Acontece-nos aquilo que somos, à medida que vamos sendo exactamente o que podemos ser em determinado momento.  

Dou um passo atrás, dou um passo à frente, olho para o lado, dou uma volta inteira e dou por mim a dançar. Vá, tudo começa por respirar





sexta-feira, 18 de setembro de 2015


Hey, Jude, don't make it bad
Take a sad song and make it better
Remember to let her into your heart
Then you can start to make it better

Hey, Jude, don't be afraid
You were made to go out and get her
The minute you let her under your skin
Then you begin to make it better

And anytime you feel the pain
Hey, Jude, refrain
Don't carry the world upon your shoulders

For well you know that it's a fool
Who plays it cool
By making his world a little colder

Hey, Jude, don't let me down
You have found her, now go and get her
Remember to let her into your heart
Then you can start to make it better

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Estava a editar a fotografia que ilustra este post e começou a passar este clássico. De repente o post passou a ser a letra do Hey Jude dos Beatles, que eu nunca tinha ouvido de forma tão atenta. Porque não há forma de tornar este mundo melhor sem nos tornarmos pessoas melhores. 

Um coração quando se fecha mirra e amarga. Um coração quando se abre sabe. 
Um coração que se fecha está em retalhos. Em obras, em trabalhos. 
Um coração que se abre vive. O que se fecha sobrevive.
Um coração que se abre derruba os muros dos seus apuros. 
Um coração que se fecha não sabe porque se esconde de saber, 
mas um coração que se abre diz-lhe que espreite. Já passou. 
Ainda agora começou... 

Todos e cada um de nós tem um coração que, ao bater, fecha e abre. Às vezes é preciso fechar para curar. Às vezes é preciso abrir para amar. E é desta dialética que se faz a vida, de polaridade, opostos, complementaridade. Mas, sobretudo, vontade.

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quinta-feira, 17 de setembro de 2015



E ontem foi o aniversário do Miguel. É uma das minhas pessoas preferidas! Trocamos sempre sorrisos e abraços como códigos de pessoas felizes: uns dias mais alegres e uns dias mais tristes, mas encontrámos a fórmula para renovar diariamente a esperança. 

Já nos conhecemos de outras vidas, mas este é o caminho desde o primeiro ao último corte de cabelo da minha nova vida, o primeiro em Outubro de 2013 e o último em Maio de 2015. O cabelo aqui é só o mediador da nossa amizade...

Parabéns! É a minha gratidão. Foste tu que me escolheste primeiro, mas eu continuo a escolher-te para fazeres parte da minha vida. :)

quinta-feira, 10 de setembro de 2015


Se há 20 anos atrás me dissessem que 70% das conversas de café passariam por olhos postos num ecrã (palpite meramente decorrente de observação), ser-me-ia difícil alcançar a dimensão do fenómeno. Se há 20 anos atrás me dissessem que 70% de uma consulta médica passaria pelo próprio médico estar a olhar para um ecrã também não iria compreender (observação outra vez, que de resto é um método científico).

Ontem, num exercício que fiz com um grupo terapêutico, presenciei o impacto que pode ter um olhar. Condescendência, empatia, permissão, atracção, tristeza, medo, expectativa, desilusão, esperança, desconfiança, mágoa, agressão, superioridade, submissão, amizade, amor, frieza, desejo, confiança, compaixão...

Um olhar pára o tempo que ninguém quer parar. 

Um olhar pára o tempo que todos queremos agarrar. 

Um olhar é um momento que te pode abraçar.

... e embalar. Sossega. Não te vou abandonar.


(Foto: Marcos Semedo)


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