quarta-feira, 26 de março de 2014

Representações de um Cancro

(aviso desde já que eu um dia vou ser condenada por ser a mais acérrima advogada do Diabo!)

Diga-se o que se disser ou pinte-se como se quiser pintar, o cancro é um bicho mau no consciente colectivo de todos nós. No inconsciente é o monstro que nos vem roubar as bolachas, até não haver mais migalhas para contar a história. Mas pior que o monstro das bolachas, que até tinha um ar simpático, este tem um ar aterrador. Demolidor. Invencível. É o bicho papão fisicalizado dentro de nós. Ele existe, materializa-se. O bicho papão da nossa infância aparecia aos meninos bons? E os meninos bons, será que insconscientemente se acham mesmo bons quando dão de frente com o papão?

O cancro está representado desta forma na nossa sociedade e basta vermos uma careca, um lenço, uma boina denunciadores que - “uhhhhh” - somos assaltados por todos estes fantasmas. O cancro é ele próprio uma representação fantasmagórica. CANCRUUUUHHHHHHH!

E o que se faz com os maus da fita? Combate-se até ao final e reza-se para que o final seja a nosso favor. Medem-se as forças. É assim um “eu sou mais forte do que tu!” “não, eu é que sou mais forte!” É um bicho que nos diz “Não” e nós fazemos birra até que ele nos diga que “Sim, ganhámos!”

Um cancro representa um grande limite, manifestado em limitação na vida da maior parte dos doentes cancerosos – quem não se sente em nada limitado, tem um cancrinho e não um cancro! Para além disso, o cancro é espaçoso, alastra-se dentro do doente e alastra-se pela família toda, a família cancerosa. Principalmente nas famílias que precisam de limites. Os limites não chegam a quem não precisa deles. (Ou será que chegam a quem já se sentia (i)limitado? Outros quinhentos...)

O cancro é assim um bicho que vem pôr a ordem pela desordem. É normal que não se lhe atribua grande crédito (apenas débito directo), porque vem destruir a ordem vigente, mas a verdade é que vem instituir toda uma nova organização que obriga a novas regras e novos limites. Novos sim’s e novos não’s. Os nim’s não nos servem para nada, não temos tempo para isso - o cancro ocupa-nos muito tempo! E é sobretudo tempo de limpar e arrumar a casa-corpo!

Pode ser que um dia se entenda a agressividade de um cancro como assertividade. “Eu não te vim atacar, eu vim ajudar-te.” diria o Sr. Cancro. Neste dia talvez o bicho-papão perca força e os pais precisem de procurar novas estratégias para assustar os filhos quando eles próprios estão assustados. Neste dia, talvez um lenço na cabeça seja só a representação de uma grande aprendizagem. Neste dia, talvez a palavra cancro seja destronada. Neste dia, talvez as mortes por cancro diminuam drasticamente. Mudam-se as crenças, mudam-se as realidades. 

P S. Mas assim como um NÃO nunca será bem aceite a não ser quando os ânimos acalmarem, o cancro também só será entendido e aceite quando o sentirmos bem longe de nós, com a certeza omnipotente de que o vencemos. Não vá o DIABO tecê-las!


Célula cancerosa no livro para crianças "Rui-Rádio" da Associação Acreditar . Talvez o Cancro seja um Sr. Zangão dentro de nós - doentes cancerosos - a precisar de se manifestar! Que tal ajudar as crianças a manifestar o Sr. Zangão em vez de lhes dizer que têm o bicho papão dentro delas? É que afinal este cancro da fotografia não parece assim tão assustador! Eu estava capaz de lhe dar um abraço, mas eu... sou maluca!





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