quinta-feira, 1 de outubro de 2015



Cada um de nós é protagonista do seu próprio filme de vida. Mas cada um de nós é também ator secundário dos filmes das pessoas que são importantes para nós. E calha que ainda figuramos na vida de todas as pessoas que se cruzam connosco e que reside aí uma quota residual de responsabilidade - ainda hoje dei um encontrão a uma rapariga cega e cedi o lugar no comboio a uma mãe com uma criança de colo. A diferença em relação ao cinema é que, no cinema, o guião é imposto, ainda que aceite a priori; na vida real, acreditamos - eu acredito - que somos nós que o escrevemos, à medida que fazemos escolhas. Será mesmo assim? Seja como for, é da responsabilidade do ator no cinema ou da pessoa na vida real interpretar ou desempenhar, de forma fiel e honesta, o seu papel. E assumimos vários ao longo da vida.

Na vida real, também há cenas que nos parecem escritas por "alguém", um qualquer destino que nos calhou na rifa, um fado incontornável que simplesmente se dá. Por um lado, acredito que a tomada de consciência relativamente aos nossos comportamentos, pensamentos e emoções, mas principalmente do impacto que estes têm nos outros e nas situações a cada momento, diminuirá a sensação de vítima de um "destino fatal" (uma redundância). Por outro lado, há mesmo merdas que nos acontecem que parecem obra do Destino, aquele gajo que só não ganhou ainda o nobel da Literatura porque os tipos que atribuem os prémios têm medo de fantasmas.


O Destino é lixado porque é um gajo dúbio: tem pacto com o Diabo e tem pacto com Deus. Interessa-lhe uma boa história, tenha ela "uma casa na pradaria", "música no coração" e um "barco do amor" ou uma "lista de schindler", "pesadelos em elm street" e um transatlântico de nome "titanic". É por isso que a mesma pessoa pode ter momentos de terror na sua vida que aparecem sob a forma de catástrofe ou de mansinho sem a pessoa se dar conta, a par de momentos mágicos em que tudo se encaixa na perfeição sem o mínimo esforço, de preferência em slow motion.

Imaginando que eu já fui anjinho e que, antes de encarnar, escolhi o guião e aceitei protagonizar o filme da minha vida atual (como algumas teorias defendem), a psicose agrava-se. E às vezes pergunto-me se a diferença entre saúde e doença mental, para além de ser quantitativa, como costumo dizer, não está não na adaptação à realidade, mas na adaptação à sociedade e aos códigos sociais.

Cada um de nós é ator principal, ator secundário e figurante. Não estamos sozinhos no filme. É difícil dosear responsabilidade e liberdade, saber onde terminam as nossas e começam as dos outros. Mas, se cada um se sentir responsável e livre (quase uma redundância também!), cada um vai reconhecer essa responsabilidade e essa liberdade no outro.

Quanto ao Destino, dêem-lhe de uma vez o Nobel para ele ir para uma ilha, ter uma vida louca só para ele e deixar de se entreter com as dos outros! E não falei aqui nos espectadores, mas o público fica para outra oportunidade, porque eu também tenho medo de fantasmas...

terça-feira, 29 de setembro de 2015



Que bom que haja cada vez mais pessoas alinhadas com o propósito de tornar o mundo melhor, com pessoas mais criativas/felizes, co-criando, co-pensando e coexistindo! Hoje, por ter dado aula com bossa nova de fundo, o meu aluno/cliente de pilates fez uma "viagem" gigante até aos seus tempos de faculdade e ao tempo em q viveu no Brasil. E é nisto que acredito, na experiência criativa-expressiva como passaporte para o contacto com a experiência pessoal, como potenciador de auto-conhecimento e como motor de interação entre culturas e coexistência de diversidade e unicidade na aldeia global. Todos conhecem a linguagem das emoções. Todos conhecem a linguagem não verbal. Nas coisas mais simples moram os segredos mais preciosos. Cada vez acho mais que a complexidade é uma manobra de diversão e abstração. Importa estar, ser e descobrir. O resto é ir.



Sei que coexistimos com pessoas que não são nada disto ou que não estão nesta frequência, mas a minha estratégia de eleição - não quer dizer que não seja opção - não é combativa: não quero combater inimigos, doenças, resistências, medos e contrariedades. O meu lema é aumentar o que quero em mim, para a minha vida e para o mundo: amigos, saúde, confiança, amor e oportunidades.


Se aumentarmos o coeficiente de coisas boas, as difíceis tornam-se menores; ou continuam grandes, mas não definem a vida; nem a vida, nem uma pessoa, um país, uma família, um relacionamento ou um sonho. O problema é quando não há espaço para coisas boas. O problema é quando não há espaço para sonhar.                                                       

quarta-feira, 23 de setembro de 2015


Já devem ter ouvido esta canção. É do Agir. Não confundir com o movimento da Joana Amaral Dias, que leva mais a sério do que eu esta coisa da Ação. Aliás, eu acho que o bebé da J.A.D. vai nascer com a língua de fora e com uma tattoo a dizer "amor de mãe, mulher e cidadã livre e responsável". Com iniciais, que um recém-nascido não tem pele para isto tudo... Mas é assim mesmo, os nossos genes trazem inscrições pré-históricas e depois levamos uma vida a descobrir o que é nosso, dos nossos pais, do ambiente, dos astros ou do destino.

Hoje acordei com um torcicolo. Alguém me "partiu o pescoço". Os torcicolos, para mim, estão relacionados com a resistência a olhar para o lado e ver outras perspetivas ou mudanças de direção. Hoje eu acho que este meu torcicolo me pede para olhar em frente, como um burro, para me focar numa direção e manter-me nela. Às vezes também é bom não olhar para o lado, não nos distrairmos com interferências que podem ser desde pessoas a acontecimentos, emoções e pensamentos que nos vêm desviar do caminho.

"Ela parte-me o pescoço. É impossível não olhar para trás." Hoje é-me impossível não olhar para a frente. Ainda bem que, segundo o povo, é para aí o caminho.




P.S. Quando este bloqueio passar, provavelmente, vou voltar a olhar para o lado e perceber que posso mudar de direção sem culpa, sem medo e sem me chatear com as interferências que me vêm mostrar novas possibilidades. Novos caminhos nos esperam quando nos abrimos a eles. Agora ainda não consigo saber quais são, mas venham eles!

segunda-feira, 21 de setembro de 2015



A mesquinhice é a arte de dar importância a coisas relativamente relevantes, que naquele momento escolhemos ver como apocalípticas porque temos a visão limitada. 

Ser mesquinho é ter medo de perder: o dinheiro, o amor dos outros, o tempo, o autocarro, a razão, a vida, o sentido, o controlo, o poder, a cabeça; é não saber esperar para ver mais além; é estar muito triste; é invejar o mundo dos outros que não está a acabar (será que não está?); é ser pequeno e querer que o mundo caiba na palma da sua minúscula mão; é ser esquecido porque não importa lembrar o que se tem ou o que já se é (é ser-se ingrato, portanto). 

Ser mesquinho é querer ser perfeito e não perdoar um cêntimo no troco; é sentir-se imperfeito e chorar a imperfeição dos outros; reclamar da justiça divina e do árbitro do jogo, que é o mesmo.  




Quando estava internada, na fase mais complicada, recebi a visita de uma amiga que me disse: 

"Rita, olha para isto tudo como se fosse um filme!"

Não é uma competência fácil, a de nos distanciarmos de nós mesmos e do que estamos a viver. Também não é fácil ter uma visão abrangente quando estamos no aqui e agora. Se calhar nem é suposto. Acho mesmo que não é suposto. Mas a tendência para a mesquinhice advém do apego ao que sentimos que temos, porque o que temos nos dá uma segurança sem a qual não podemos viver. E é tudo ilusão. Conseguimos sobreviver à diferença, às mudanças e ao caos. Há vida depois da "morte". Se pode ser o inferno, também pode ser o paraíso! 

Para contrariar a mesquinhice, só a fé: acreditar sem garantias, confiar sem saber. Não nos queixemos de barriga cheia. 

Não discutas trocos, não compares a tua dor à dos outros, não te queixes da falta de tempo, não sejas impaciente, não julgues cada comportamento, não negligencies cada passo que dás, não subestimes a inteligência terrena, divina ou qualquer uma que esteja subjacente à vida. Não te esqueças. Sobretudo não tenhas a memória curta.

De repente, senti-me a Alexandra Solnado, a canalizar a mensagem de Jesus. Não, não baixou em mim nenhuma entidade superior (ou se calhar, estou mesmo possuída e não sei porque isto são tudo vozes que habitam a minha cabeça! Não se manifestem mais do que isto, seres do além-Terra, que eu não tenho saúde para essas aventuras...). 

É exactamente quando reconheço a mesquinhice, para comigo, para com os meus ou em mim que digo para mim mesma: "Não te esqueças!" E esqueço-me todos os dias de muita coisa, mas não do mais importante: está tudo certo!

Não há coisas urgentes a não ser mesmo viver, dizer a alguém que é importante para nós ou socorrer outro alguém de um enfarte (e mesmo assim, deixem lá o senhor que se calhar está só enfartado disto tudo!). Tudo se resolve. Tudo vai para onde tem de ir. Anda tudo com pressa não sei do quê. Eu às vezes também penso nos meus 35 anos e questiono o que ainda não vivi ou conquistei, mas depois pergunto-me "para quê? estou com pressa mesmo do quê?".

Acontece-nos aquilo que somos, à medida que vamos sendo exactamente o que podemos ser em determinado momento.  

Dou um passo atrás, dou um passo à frente, olho para o lado, dou uma volta inteira e dou por mim a dançar. Vá, tudo começa por respirar





sexta-feira, 18 de setembro de 2015


Hey, Jude, don't make it bad
Take a sad song and make it better
Remember to let her into your heart
Then you can start to make it better

Hey, Jude, don't be afraid
You were made to go out and get her
The minute you let her under your skin
Then you begin to make it better

And anytime you feel the pain
Hey, Jude, refrain
Don't carry the world upon your shoulders

For well you know that it's a fool
Who plays it cool
By making his world a little colder

Hey, Jude, don't let me down
You have found her, now go and get her
Remember to let her into your heart
Then you can start to make it better

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Estava a editar a fotografia que ilustra este post e começou a passar este clássico. De repente o post passou a ser a letra do Hey Jude dos Beatles, que eu nunca tinha ouvido de forma tão atenta. Porque não há forma de tornar este mundo melhor sem nos tornarmos pessoas melhores. 

Um coração quando se fecha mirra e amarga. Um coração quando se abre sabe. 
Um coração que se fecha está em retalhos. Em obras, em trabalhos. 
Um coração que se abre vive. O que se fecha sobrevive.
Um coração que se abre derruba os muros dos seus apuros. 
Um coração que se fecha não sabe porque se esconde de saber, 
mas um coração que se abre diz-lhe que espreite. Já passou. 
Ainda agora começou... 

Todos e cada um de nós tem um coração que, ao bater, fecha e abre. Às vezes é preciso fechar para curar. Às vezes é preciso abrir para amar. E é desta dialética que se faz a vida, de polaridade, opostos, complementaridade. Mas, sobretudo, vontade.

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quinta-feira, 17 de setembro de 2015



E ontem foi o aniversário do Miguel. É uma das minhas pessoas preferidas! Trocamos sempre sorrisos e abraços como códigos de pessoas felizes: uns dias mais alegres e uns dias mais tristes, mas encontrámos a fórmula para renovar diariamente a esperança. 

Já nos conhecemos de outras vidas, mas este é o caminho desde o primeiro ao último corte de cabelo da minha nova vida, o primeiro em Outubro de 2013 e o último em Maio de 2015. O cabelo aqui é só o mediador da nossa amizade...

Parabéns! É a minha gratidão. Foste tu que me escolheste primeiro, mas eu continuo a escolher-te para fazeres parte da minha vida. :)

quinta-feira, 10 de setembro de 2015


Se há 20 anos atrás me dissessem que 70% das conversas de café passariam por olhos postos num ecrã (palpite meramente decorrente de observação), ser-me-ia difícil alcançar a dimensão do fenómeno. Se há 20 anos atrás me dissessem que 70% de uma consulta médica passaria pelo próprio médico estar a olhar para um ecrã também não iria compreender (observação outra vez, que de resto é um método científico).

Ontem, num exercício que fiz com um grupo terapêutico, presenciei o impacto que pode ter um olhar. Condescendência, empatia, permissão, atracção, tristeza, medo, expectativa, desilusão, esperança, desconfiança, mágoa, agressão, superioridade, submissão, amizade, amor, frieza, desejo, confiança, compaixão...

Um olhar pára o tempo que ninguém quer parar. 

Um olhar pára o tempo que todos queremos agarrar. 

Um olhar é um momento que te pode abraçar.

... e embalar. Sossega. Não te vou abandonar.


(Foto: Marcos Semedo)


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