Partindo da minha linha de pensamento e das pesquisas que tenho vindo a fazer na área, falo hoje da doença como símbolo, baseado no livro "A Doença como Caminho" de Thorwald Dethlefsen (psicólogo) e Rüdiger Dahlke (médico e psicoterapeuta). E começo por dizer que, como doença, refiro-me ao conjunto de sintomas que é tomado como tal, mais do que propriamente ao nome que se lhe dá. E mais, refiro-me apenas à forma como esses sintomas são percepcionados mais do que à forma que assumem por si só. Por exemplo, a minha mãe hoje tem uma dor num braço que a deixa aflita e condicionada. Interessa-me mais a sua aflição e a forma como descreve o que sente ("parecem mordidelas de cão") do que o diagnóstico em si, porque acredito que aí reside a chave do seu cofre. Mas voltemos atrás.
"A nossa linguagem é psicossomática. (...) O doente ao falar dos seus sintomas corporais costuma descrever um problema psíquico." Para os autores, temos de usar o pensamento simbólico, através de analogias, para entender o que se passa a nível mental e que teve manifestação no corpo, não porque uma situação leve à outra, mas porque os dois planos acontecem em simultâneo, o físico e o mental, e um tem sempre representação no outro. Assim como o Variações dizia que o corpo paga "quando a cabeça não tem juízo", aqui a falta de juízo é reprimida ou remetida para uma "zona de sombra", por "repúdio ou resistência": "o corpo tem de viver aquilo que o indivíduo se escusou a assumir conscientemente." Ou seja, o sintoma físico tem a sua correspondência no plano psíquico, mas a um nível inconsciente. Aqui acrescento que a maior parte das vezes sabemos bem o que nos está "a morder" por dentro, mas não o queremos verbalizar, ou seja, assumir. É um gato escondido com o rabo de fora.
"Aquilo que se manifesta no corpo está também na alma: assim na Terra como no Céu." A proposta dos autores não é eliminar os sintomas por si só, mas aceitar as sombras que neles residem. "Se a ampliação da consciência produzir automaticamente uma modificação subjectiva, pois fantástico", o que normalmente acontece.
E o que fica na sombra? Todos os impulsos difíceis de assumir, muitas vezes alvo de julgamento individual e social e que podem dar a origem a comportamentos não adaptados dos pontos de vista individual e colectivo ou a consequências difíceis de aceitar por parte primeiro do próprio e depois dos outros. Os instintos agressivos e sexuais são dos mais relegados para a sombra, mesmo que a sua saída pudesse passar apenas pelo verbo e não exactamente pela acção, nem sempre possível ou desejável. Mas a agressividade pode ser bem mais perigosa na sombra. "Enquanto a agressividade (ou qualquer outro impulso) permanecer na sombra, subtrai-se à consciência e isso é que a torna perigosa." Não há sol sem sombra. E eu sei como a minha mãe estava irritadaaaa no dia em que o braço quase paralisou. Teria sido conveniente ter dado um murro em alguém? Bom, talvez não fosse a saída adequada, mas como ideia, não era má de assumir. Até porque no campo das ideias tudo é possível. Graças a Deus e à inteligência divina que não nos põe limites na fantasia!
Mas então qual é a dificuldade em chegarmos ao cerne da questão? É que estamos sempre mais ocupados a perseguir culpados e em combater do que em dar tréguas e apaziguar a nossa mente. "Aquele que combate ou que persegue jamais atingirá o seu objectivo". Para além disso, como os sintomas das doenças são "avaliados muito negativamente, tanto pelo indivíduo como pela colectividade, (...) não são vividos e vistos de modo consciente."
Qual é a proposta? "Abstrair-se do sintoma e transpô-lo para o plano psíquico. Escutar com atenção as expressões idiomáticas que nos poderão servir de chave."
"É importante que o indivíduo se deixe perturbar pelo transtorno. Um sintoma não faz mais do que corrigir um desequilíbrio: o hiperactivo vê-se forçado a descansar, o irrequieto é forçado à imobilização, o comunicador compulsivo obrigado a silenciar-se. O sintoma activa o pólo rejeitado. Há que (...) abraçar sem hesitações aquilo que nos é imposto. A doença é sempre crise e toda a crise exige evolução. Qualquer tentativa no sentido de recuperar o estado anterior à doença é prova de ingenuidade ou de tolice. A doença pretende conduzir-nos a conhecer novas zonas desconhecidas e ainda não vividas; quando atendemos ao chamamento de modo consciente e voluntário, damos um sentido à crise."
Agora quem é que vai dizer à minha mãe para ficar um dia com o braço quietinho?
A minha proposta é semelhante mas tem algumas diferenças porque eu entendo um sintoma como um veículo de expressão, da seguinte forma e por esta ordem (e é assim que tenho lidado com os sintomas que têm surgido nos últimos meses que, de outra forma, podiam levar-me a ficar apenas centrada e obcecada com a doença):
Situação (Sintoma) Emoção
e que normalmente aparece assim:
(Situação) Sintoma (Emoção)
com o sintoma a aparecer em neón, a piscar.
O sintoma é o mediador e condutor da expressão que não teve lugar. Através do sintoma é-nos permitido finalmente expressar livremente (ainda que em forma física de bloqueio, porque o conflito psíquico ainda está presente), até porque, enquanto doentes, é um direito que nos assiste. Assim que identifico a minha emoção - facilitada pela sensação proporcionada pelo sintoma - e a situação que me incomoda, trato de mudar a minha crença em relação à mesma, aceitando-a como ela é se não estiver ao meu alcance mudá-la ou agir de acordo com o que pretendo, dentro das minhas possibilidades. E um sintoma que perde protagonismo é um bicho que perde força e se retira de cena. (Mas um dia destes volto a este assunto.)
Termino com a frase dos autores: "A DOENÇA TORNA-NOS SINCEROS".
P.S. Para quem conseguiu chegar a este post scriptum, vou voltar a este livro para vos contar da interpretação dos autores especificamente do cancro.
P.S.2 Peço desculpa à minha mãe por utilizá-la como exemplo, quando me podia ter exposto a mim, mas foi o timing da coisa. Hoje é ela.
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