Na sequência do post anterior sobre sustentabilidade,
partilho convosco a minha opção pela passada e pelo espírito da tartaruga,
neste caminho.
Quando se passa por um período sabático imposto pelas crises
da vida, quando se retoma as actividades antigas, há como que um ímpeto para
recuperar o tempo perdido. A tendência é acelerar porque há tanta coisa para
fazer e vida para viver! Ou não. Porque viver a vida pode ser para muitos, e
sobretudo na era fast, desacelerar.
Ora eu queria acelerar desaceleradamente. Ou seja, acelerar
relativamente à pasmaceira a que uma doença incapacitante obriga e desacelerar
relativamente ao ritmo anterior à doença ou ao ritmo que impera na sociedade
actual. In medium virtus est.
Acontece que, quando retomamos as actividades que não
fazemos há muito tempo e sobretudo quando vimos de um período que nos queimou
muitos neurónios (pela toxicidade do tratamento e/ou pela experiência
emocionalmente traumática), metemos a primeira e tão rapidamente não chegamos à
quinta… Em vez de devolvermos o carro à oficina e escrevermos no livro de
reclamações (é sempre bom reclamar, de qualquer maneira! Não há direito!), há
que tratar a máquina com carinho e esperar que os motores aqueçam devidamente…
No período de adaptação, há uma dissonância entre a imagem
que temos de nós e a pessoa que se apresenta. Até essas duas imagens se
encontrarem entre o que fomos e o que podemos ser, ansiedade, emoções e
desespero (muitas vezes sob a forma de dores) podem vir apimentar este cenário.
A única forma de resolver isto é com a-tão-na-moda-aceitação.
Não há volta a dar. Mas antes de aceitar, pessoas, há todo um processo para lá
chegar. Não é só dizer “eu aceito” e reprimir todas as manifestações que fazem
parte do processo de luto (do passado) e de adaptação à mudança. E cada um tem
o seu ritmo. Por exemplo, para quem perde um emprego e se vê socialmente
“descapacitado” porque só é considerado válido quem trabalha, produz e
contribui, tem de se redescobrir como “desempregado”, o que é muito mais do que
“des-empregado”, porque continua a haver muitas formas de empregar o tempo e a
energia e, provavelmente, muitas mais do que havia antes! Adaptação, aceitação
e, no final… gratidão!
Gratidão?? Então vou agradecer por me ter caído um raio em
casa e ter perdido “tudo”? Sim! Porque, se um azar nunca vem só, não é por
incompetência “universal” mas porque umas coisas despoletam outras para nos
encaminharem para determinadas mudanças que temos de fazer e as quais, se
calhar, até queríamos e não tínhamos coragem de realizar. Bom, tema para outro
post!
Voltando ao tempo e à tartaruga, durante este ano
pós-guerra, tudo se vai desenrolando e
enrolando, assim por esta ordem e no repeat!
Dificuldades, sintomas, resolução, dores, conflitos, ansiedade, esperança,
gratidão, ingratidão… Tudo eu, tudo meu! E o tempo mental desencontra-se tantas
vezes do tempo real! Solução para isto? Decidi que faço tudo devagar e sem pausas, como a tartaruga.
Não por não ter direito a pausas mas porque até as pausas significam que
continuo no caminho. Devagar se vai ao
longe. A dor não vai desaparecer do dia para a noite, o projeto não se vai
realizar do dia para a noite, a vida não são só dois dias, entre a noite de um
e o dia de outro.
Os médicos imputam-nos uma urgência de agir que nos empurra
para uma catadupa de ações no sentido de combater a doença, sem tempo para
digerir e processar a informação, quanto mais integrar a experiência… É urgente, o inimigo pode avançar e tomar
conta da situação! É uma competição e queremos chegar primeiro, com ou sem
vida! Se não agirmos pode ser tarde! Amigos, demorei 34 anos a chegar onde
cheguei, não vou demorar um mês a reverter seja qual for a “alhada” em que me
meti!
A sociedade imputa-nos uma urgência de sermos activos e
produtivos antes que falte dinheiro para comer, uma pressa que nos impede de
usufruir do caminho e do que vamos comendo entretanto!
Só que não. Não é a sociedade, não são os outros. A escolha
é nossa, a de escolher o tempo e o ritmo com que queremos fazer as nossas coisas.
Não há longevidade sem sustentabilidade nem sustentabilidade com pressas e
precipitações-daquelas-com-precipícios.
Estou a fazer tudo o que quero fazer focada no processo e
não no resultado, embora tenha em vista o resultado. Ele está lá, só não é
imediato. Porque os resultados só vão
chegar se abraçar cada tijolo. E os abraços querêmo-los longos e bons. Ou
não?
Sem pressa e sem pausas.
P.S. Já escrevi isto anteontem e estou a publicar numa semana particularmente cheia e acelerada para tartaruga!
(imagens do google)
Sem comentários:
Enviar um comentário