Parte I
O corredor é, ao mesmo tempo,
aquele que corre e um sítio que se percorre. Fiz muitas piscinas no corredor do
piso 2 do Pavilhão de Medicina do IPO de Lisboa, de carrinho na mão, de um lado
ao outro. Era só um, um corredor, com alguns sofás no caminho. Os sofás azuis,
grandes poltronas! Azul é também a cor que associo ao Hospital de Cascais. Deve
ser por ser a cor que acalma, sendo também a que entristece (blues). Só
desmaiei uma vez. Não sou muito de desmaios. Imaginem uma pessoa que tem
dificuldades em adormecer: eu. Como é que eu ia ser pessoa para desmaiar?
Haverá mais perda de controlo do que andar a desmaiar por aí? Então, perdi os
sentidos uma vez no corredor. Não sei bem como, acordei já na cama. Seria a 1, a 3, a 5, a 7 ou a 9? Só morei em camas de número ímpar. Em quartos sempre de
quatro camas. E o corredor era para andar, para me mexer, principalmente depois
dos quase 10 kgs perdidos no primeiro mês de internamento. “Não te quero na
cama!”, diz a Dra. S., chefe de equipa, quando chego no segundo internamento,
já mais recuperada das maldades do primeiro ciclo de quimioterapia. E aquele
corredor era aquele corredor, com princípio, meio e fim, para a frente e para
trás, de um lado ao outro, uma e outra vez. E a vista da janela, um mundo que
corria lá fora. No corredor, não se corre. Os doentes nunca correm. Podem
correr os enfermeiros, os médicos, os familiares, os auxiliares - para acudir -
mas os doentes não. A vida vai lenta quando se adoece. O tempo não passa -
escapa.
Parte II
Descobri esta semana que não
gosto de corredores desconhecidos, corredores labirínticos infindáveis, onde me
desoriento e me perco. E se for urgente? E se tiver pressa? Não gosto. Mostrem-me
o caminho. Estou farta de procurar caminhos. Deem-me um corredor e eu faço-o
vezes sem conta, para trás e para a frente, para a frente e para trás. Sempre
tive bom sentido de orientação. Não me importo de me perder nas estradas,
porque sei que vou sempre encontrar o caminho. Mas esqueçam lá os corredores
onde toda a gente corre de forma lenta. Porque a vida fica assustadoramente
lenta quando queremos que corra. E porque, na tua vida, nem sempre és tu o corredor.
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