Segunda-feira, 7 de Abril de 2014
Li o livro da Vânia em quatro horas, sozinha no silêncio da
noite. Precisava desse encontro silencioso para a ouvir com o coração. Queria
entrar na sua história, como espectadora mas parceira nas emoções. Dizia o
Roberto Carlos “o importante é que emoções eu vivi.” E é impossível não
embarcar nesta viagem que é a da Vânia, a minha e a de todos nós, como ela diz,
seja cancro, acidente, verruga no nariz, desemprego ou balde de água fria.
Aliás, todos grandes baldes de água gelada.
Independentemente de ninguém estar preparado para um cancro,
há sempre toda uma história prévia que nos encaminha inconscientemente para a
sua chegada e, com algum trabalho de casa, para a sua partida, pois claro! Por
um lado, reconheço que, quando somos negligentes connosco mesmas, relativamente
ao que somos e para onde queremos ou precisamos de ir, estamos mesmo a pedi-las.
Por outro lado, revejo-me na história da Vânia no sentimento de saber que temos
de passar por tudo aquilo que estamos a passar, mesmo nas fases sem
perspectiva, mesmo nos períodos mais difíceis, mesmo quando o chão teima em
tremer ou desaparecer, mesmo quando parece que não estamos a ir para lado
nenhum e mesmo quando esse rio desagua num cancro. Há uma teimosia que nos leva
a um porto pouco seguro. Mas há uma convicção de que é por ali, por uma causa
maior. E a causa maior é a missão, o sentido de missão que nos faz quase
agradecer termos tido o privilégio de termos tido uma merda de um cancro para
finalmente entendermos para onde vamos. Ainda não sei muito bem. Mas, como eu
costumo dizer, “ok, mas não quero mais brincar a este jogo!”
Permissão para ser
feliz. Se depois da tempestade vem a bonança ou depois da bonança a
tempestade, certo é que a vida é dinâmica e feita de dualidades. Claro que o
português tem todo um lado saudoso e dramo-queixoso para cultivar que o faz exigir
à felicidade que peça licença para entrar, mas também acredito que há uma
factura a pagar quando acumulamos tudo muito. O corpo constitui o escape quando
não existe outro, mesmo que a catarse surja num momento em que finalmente somos
felizes. Mas e todos os outros momentos em que as nossas células reclamaram e
não foram ouvidas? Toma lá com um batalhão de células revoltadas a boicotarem o
tempo para ser feliz!
Também tive seis meses de recolhimento/internamento até
assumir publicamente tudo o que me estava a acontecer. Não me pareceu
pertinente ou vantajoso partilhar a desgraça mas fez-me sentido começar a
partilha a partir do momento em que eu própria fui descobrindo todos os
recursos que tinha para transformar a experiência dramática num processo
criativo e numa oportunidade de vida.
Encontrei o blog da Vânia numa fase em que senti necessidade
de me rever noutras experiências e tenho vindo a acompanhar a sua aventura.
Ler
o livro fez-me perceber que nunca escrevi sobre os tais seis meses obscuros, que
talvez me custe fazer toda essa viagem, mas que também talvez aí resida a chave
para a porta da minha próxima paragem. Ou então não. Houve um processo intenso
físico experienciado que me permitiu uma cura interna que talvez não necessite
de verbo, porque não está ao nível das palavras.
Ler o livro fez-me questionar
que partes da minha história teria eu coragem de expor, com a generosidade com
que a Vânia o faz.
Ler o livro fez-me chorar na parte em que a família se
manifesta, porque os outros nesta história de ter cancro caminham connosco numa
estrada paralela, sempre ao nosso lado, mas sem poderem saber o que é estar no
nosso lugar, numa angústia desonesta. (Mas, Vânia, se eles têm de alterar a sua
vida por nossa causa, é porque a nossa causa também lhes pertence, porque eles também estarão a precisar dessa mudança e porque a
nossa cura também lhes permite o encontro com o que eles precisam de curar em si
mesmos. No meu caso, a doença fez-me voltar para Portugal, mas acredito que as
mudanças específicas e particulares que a doença exige sejam as necessárias,
para nós e para os que nos rodeiam.)
Ler a Vânia motiva-me porque a sua
felicidade é contagiante e inspiradora. Eu sei que, se ela é capaz, todos
somos. E vamos que vamos!
No dia 12 de Abril a Vânia vai dar um WS a carequinhas lutadoiras, onde vai partilhar todas as dicas que tem vindo a publicar no blog e que constam do livro, no âmbito do seu projecto "Lenços da Solidariedade". Até lá podem doar lenços, entre outros locais, no Jardim da Cerveja (para quem está em Cascais), os quais serão redistribuídos por outras cabeças lindas que também se estão a curar, de corpo, alma e coração. Consultem o blog e a sua página no facebook. O lançamento do livro será no dia 17 de Abril, na Fnac do Chiado, pelas 19h.
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